terça-feira, 26 de agosto de 2008

Sangue de barata

Aqueles rostos prestes a atacar o interlocutor...
Aqueles rostos desacreditados, desequilibrados...
Aqueles rostos inflamados por algo novo...
Aqueles rostos que queriam segurar o poder...
Aqueles rostos...
Não me parecia nada além de umas simples palavras...
Porém, não pude deixar de notar na loucura ali emanada...
A loucura dos famintos...
Dos ávidos...
Dos inescrupulosamente gananciosos...
Inquisidores da culpa...
Queriam culpar o mundo...
Enquanto a si mesmos caberiam apenas balanços afirmativos...
Automáticos...
Compassados...
Sincronizados...
De cabeças ocas...
Que alienaram seu direito natural de pensar...
Em nome da especialidade alheia...
Da falácia sempre presente
Do pregador perfeito...
Da máquina de produzir conversa fiada..
Em embrulhos pedanticos...
Fica dificil entender assim as pessoas e o que elas realmente querem...
Quanto a mim, só queria sair dali.
E tomar uma cerveja...
E quem sabe pensar um pouco na vida...
E quem sabe planejar um pouco meu futuro...
Ou, quem sabe...
Nada disso tudo.




Felipe Ribeiro.

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Alguns segundos para minha alma

Por acaso, num sebo vagabundo.
Em meio a clássicos antigos e empoeirados...
Foi uma visão interessante... Contrastante...
Ali, na minha frente, a beleza e a loucura dos homens...
Escritas com louvor, angustia e alma..
E do meu lado a beleza de um simples sorriso.
Um sorriso bobo de uma moça que estava satisfeita...
Momentaneamente satisfeita...
Por ter encontrado alguns exemplares.
Um simples e ingenuo sorriso de satisfação...
Como se o infinito se fechasse no perene.
Ha coisas que simplesmente queimam...
E lá estava eu... queimando toda a certeza que tinha,
Toda segurança forjada pela solidão,
Queimando a mim mesmo...
Por um simples sorriso feminino...
Deveria prestar mais atenção nas coisas simples...
para não correr o risco de me queimar pelo encanto do belo,
do ingenuo, do puro... e do estonteante...


Felipe Ribeiro.

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

E no sexto dia...

Olha lá, olha lá! Vai bater! - o menino me disse.
É... vai bater... - eu disse.
Nossa! Bateu! - o menino disse.
É... bateu... - Eu disse.
Alguém liga pros bombeiros! - o menino gritou.
... - eu disse.
Meu Deus! Que tragédia! Não, não mecha na cabeça dela! - Uma senhora disse.
Fique quieta, os bombeiros já estão vindo! - o menino disse.
... - eu disse.
Os bombeiros chegaram! Fique calma! - a senhora disse.
Afastem-se! - o bombeiro disse.
AHHHH AIIAIAIAIAI AHHHHHHHH, MINHA PERNA, AHHHH! - a mulher disse.
Então o carro dos bombeiros saiu em alta velocidade. Então todos voltaram para os seus afazeres. Eu fiquei ali, olhando aqueles pedaços de plásticos e vidros estilhaçados misturados ao sangue no asfalto.
Me virei, sentei e esperei o ônibus no ponto. Voltei minha atenção para a pipoca que eu deixei de comer para ver o acidente. Perdi o apetite e dei a pipoca para o menino que ainda estava agitado com o acidente.
Obrigado! - o menino disse.
Tudo bem. - eu disse.
E no mesmo instante o menino esqueceu do acidente, devorando com prazer a pipoca. Assim como Deus descansou no sétimo dia. Cada um escolhe o que lhe é melhor, não foi sempre assim?


Felipe Ribeiro

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

A flor de lótus

E a pequena moça pálida caminha.
Com leveza, esperando, escutando... se afirmando.
Frágil, indiferente... soturna.
Exala um perfume incomum.
O perfume da inteligencia.
Ela anda com leveza, mas traz na fronte um escudo.
Esse escudo a protege...
Apesar de ela não se preocupar com os golpes.
Ela cai.
Sempre cai.
Se levanta.
Sempre se levanta.
E volta a bailar... Com seus passos surdos, leves...
Dança no escuro consigo.
Ri da parede a sua frente,
Ri... apesar de não vermos seu sorriso todas as vezes.
Mas... Quando se tem a chance de vê-lo...
Tudo se resolve, por um momento.
Pra si e pro mundo.

Felipe Ribeiro

Para a "panda"

Ahh, ela e todo seu ser...
Como posso descrever algo mais autenticamente bom?
Um simples "ahhhhh" já fala muito...
É um suspiro automático, veemente...
Do tosco que tem a visão ofuscada pela Beleza em si.
A beleza emanada da carne, a beleza emanada da forma...
A beleza emanada do espírito.
Um simples "ahhhhh" já fala muito...
Mas não o tudo que me engasga...
Mas não o todo que me sufoca e me faz reviver,
Renascer, entorpecer, estremecer e empalidecer...
O misto de medo e fascinação me assombra e me chama.
Me chama como a luz da lâmpada chama a mariposa,
Me chama como a aurora convoca os pássaros a cantar,
Me chama como o afogado chama o ar,
O desesperado chamando pelo socorro,
O homem de paz chamando o hábito,
A quentura chamando a sombra fria,
A necessidade chamando a satisfação.
Um simples "ahhhhh"... Um meloso engano
Mas certamente um encanto, um suspiro infimo de libertação.
Um segundo de vida
Um momento de valorização.
Os olhos e suas penumbras... Vislumbram e deixam aparecer sua força
Sua audácia
Sua doçura
Seus medos
Seus anceios
Seu querer.
E eu, amarrado, dormindo, distante.
Distante... Mas não ao ponto de não sentir,
Não ao ponto de imaginar, talvez
O dia...
Que seja apenas um dia,
Mas o dia...
Que irei te amar...
Por completo, enfim.


Felipe Ribeiro

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Enquanto não venho pra mim.

Então lá estava eu, sentado num banco,
Escorando meus cotovelos no balcão daquele bar.
Esperava um milagre ou algo do genêro acontecer.
Esperava tanto que cansei de esperar e resolvi prestar atenção ao meu redor.
Estava acostumado com as piadas sem graça dos outros desafortunados dali.
Enfim, depois de quatro doses de uísque o mundo fica mais familiar.
E você consegue até mesmo sentir graça em tudo.
E consegue entender a sutilidade da desgraça alheia.
E da sua própria também.
E o mundo lá fora, choroso em chuva.
E o mundo aqui dentro seco pelo escárnio necessário.
Eis o brinde que podemos oferecer.
Eis aquilo pelo qual podemos realmente lucrar.


Felipe Ribeiro

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Puta.

Bom... enfim... é um começo desagradável, como tudo que é novo.
Não espero nenhuma mudança dramática, tão pouco uma mudança.
Mas... há de convir que o novo é um pouco dramático, um pouco surpreendente, talvez.
Ei-lá!
Outro corpo, outro toque, outra sensação.
A mesma alternativa frustrada de salvação.
O sumo absurdo do acaso.
Reviravoltas em si mesmas.
O uso circunscrito e programado...
do outro ser.
Vaso fresco, moldado pela loucura dos homens.
Diferente, único e tão igual aos outros seres.
O desespero do laço... dos laços entrelaçados.
Fortes, amarrados uns aos outros.
Indestrutíveis na medida em que se queira, na medida em que dura
o tempo pré estipulado do contrato.
Um beijo para essa ilustre desconhecida a quem me entrego.
Por prazer
Por validação
Pela vida
Vivida em vão.



Felipe Ribeiro

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Ação e Reação.

Recebi um abraço de uma mulher hoje como há muito não recebia.
Um abraço forte, que me queria e que me pressionava ao ponto da quase fusão.
Um abraço potente que estralou minhas costelas
E ao mesmo tempo fez supitar algo que estava depositado fundo e esquecido.
Algo que só um abraço forte poderia pressionar para fazer vir à tona.
O resto de minha alma jorrou de meus olhos hoje.
O resto de minha alma respirou os ares insalubres do real.
O resto de minha alma...
Veio à tona como um grito mudo, inaudivel e choroso.
Uma súplica de contato.
Um chamamento do instinto.
Um vislumbre do provável.
Um querer ser visto.
O resto de minha alma voltou a ver o mundo.
Como o último resto de uma pasta de dentes que sai do tubo seco.
Sai apenas... Como um acidente, cai no chão.
Mas sem parar na escova de dentes e na boca de quem espremeu.
Fica lá, secando no tempo, formando uma crosta até perder a utilidade.
Endurece e deixa pra tras o tubo seco.
Dai para o lixo, é um pulo.


Felipe Ribeiro

Senta e cala!

Ah! Como é doce o sabor da paz!
Mesmo que saboreada a poucos goles e em poucos instantes...
Ah! Como é bom estar indiferente!
Mesmo sabendo que o soco te espera na esquina...
Sinta a noite
O ar
Os sons
Sinta o Tempo passar e levar consigo todo o medo
Todo o mal
Toda a angústia e toda raiva.
E quando voltar para a luta todo soco que levar será mais leve...
Pois baterá em algo mais duro
Mais forte
Mais vivo.



Felipe Ribeiro

Ávida indiferença.

Escutando uma conversa entre dois espíritas:
"Mas assim.. fulano é católico... mas é bonzinho..."
Escutando uma conversa entre dois católicos:
"Mas assim, ciclano é espírita... mas é bonzinho..."

Me intrometendo na primeira conversa:
"Mas assim... Que se dane..."
Me intrometendo na segunda conversa:
"Mas então... O que eu tenho haver com isso?"

Resultado da intromissão referente a primeira conversa:
"Não ligue... Ele é um ateu."
Resultado da intromissão referente a segunda conversa:
"Não ligue... Ele é um ateu."

Resultado disso tudo:
"Não ligue."

Felipe Ribeiro

terça-feira, 12 de agosto de 2008

Carimbo e assinatura.

Você me ama? - ela me pergunta.
Penso, mas que raio de pergunta é essa? Ainda mais nessa hora do dia - meio dia e quarenta e três.
O que será que levou ela a me fazer tal pergunta a essa hora? Fome?
Escuta - eu disse - vamos fazer o seguinte... Mais tarde a gente se fala, pode ser?
Mas primeiro me diz... Você me ama? - retrucou.
Amo. - eu disse.
Então ela me abraçou, me beijou a boca, a bochecha, o nariz, a testa e o resto da cara.
Mais tarde nos vemos! - Disse ela.
Tudo bem... - Disse eu.
Fechou a porta. Vesti minhas calças. Escovei meus dentes. Mijei. Olhei pro teto e nada de ele cair na minha cabeça, como de praxis, acabamos por perder essa esperança tola de que algo pode acabar conosco em um segundo quando mais a gente quer que acabe... quando mais se precisa.
E lá se foi outro dia... Onde as palavras selam o contrato inútil de uma razão desmentida pelo simples fato da vida.


Felipe Ribeiro

Pra sempre no mesmo lugar

Ferimo-nos constantemente com o açoite do medo.
Eis as rédeas curtas, eis o arreio da razão.
Homo imobils toscus!
Penso que essa é a raça, a mais nova raça.
Derivada do Homo demiens...
Aquele que insistia em ser bípede
E falar asneiras.
Aquele que insistiu demais
E acabou perdendo a chupeta
Por castigo a sua teimosia insana
A sua insistência atormentada
De tentar ser mais do que realmente é.
O espaço consagrado a sua tolice
Foi o holocausto da esperança.
A harmonia ritmada da demência
O desarranjo perfeito
De uma sinfonia inacabada.
Talvez a única coisa que não se pode controlar;
É o simples fato de sermos, simplesmente, idiotas.
Esta no sangue...
Esta na alma...
Dos mais afortunados dos homens
Que se permitem continuar dançando o ritmo
Aquele ritmo acelerado e invariável do mundo
Dos tubarões...
Dos predadores vorazes,
Dos garanhões vazios, ocos e imundos.
Dos insignificantes agigantados.
Esta no sangue...
Esta na alma...
Dos mais afortunados dos homens
Que insistem na sobriedade caduca.



Felipe Ribeiro

A dor da escolha

Olhos ávidos
Olhavam-me com amor
Olhos marejados
Contive-me diante da súplica
Olhos amordaçados
Desviei a adaga, desferi na alma...
Olhos estraçalhados
Acertei o ponto nodal
Silêncio absoluto
E o choro cortante
Do homem que enfim se decidiu
Em buscar a paz
Como a um parto.



Felipe Ribeiro

Caminhando reto no escuro

Há de se ter, de se querer, de se buscar, de se ser...

Ou não

Talvez o que se mais queira é justamente isso

O não.

Ou... A certeza constante e aconchegante do talvez

O claro, o escuro;

O cruel, o bom;

O sádico, o masoquista;

O frio, o quente;

Ou... O meio termo disso tudo!

Há pessoas que se contentam com o meio termo

Entre o nada e o tudo

Entre o possível e o irrisório

Entre os todos e o ninguém.

Entre a paz e a guerra...

Entre si mesmos e os outros

Não há escolhas prováveis

Não há o risco comedido

Não há nem a prudência

Só o talvez... Só o talvez.

E assim voam as flechas envenenadas.



Felipe Ribeiro

Sedução

Segundo minhas próprias constatações
Estou na iminência de acabar com o que nem comecei
Talvez presumo demais que a falta é presente
Talvez é o presente que falta
Ou, quem sabe, a própria presunção?
Quem sabe? Quem sabe?
O começo se espalha na promessa
A promessa começa a fazer algum sentido
E o sentido é o que eu quero buscar
Talvez só o começo, de algo necessariamente bom e saudável.
Que contraponha a todo o fragmento desmedido dos cacos
E todos os arranhões das causas perdidas
Todos os vergões dos petiscos mal degustados
Todos os tapas na cara recebidos pela realidade cúbica,
Gelada,

Plana,

Chata,

Estúpida!
Só quero acreditar na promessa feita a mim mesmo
È... Enfim... Estou sem crédito para comigo
Vou botar na minha conta...
Mais uma maldita vez!



Felipe Ribeiro

Os dois extremos

Escutando "as bodas de Fígaro"
Bebendo um copo de uísque vagabundo.
A sutileza de dois extremos...
Escuto e bebo...
Não sei o que é melhor...
A sutileza de dois extremos...
É um arrepio acre que mastiga e cospe...
Mastiga toda mágoa e cospe toda descrença
Esta na sutileza.. na sutileza desses dois extremos
Ver, ouvir, beber, sentir e embriagar-se duplamente.
Duplamente... Onde convergem a dor e o vazio
Eis onde nasce a esperança...
Morta...
Eis onde se vislumbra o herói inútil...
A boa vontade cheia de máculas...
O podre do puro...
O suspiro ínfimo do tudo...
A sutileza esta aí...
Nos dois extremos...

Felipe Ribeiro


Mais uma tréplica qualquer

Sinto o dia como um chicote
Abro a porra dos meus olhos
fico cego com a luz do sol na minha cara
Depois de uma bebedeira
uma noite maravilhosamente desconfortável na rua
sozinho
livre
Alcanço a parede pra me apoiar
me levanto e vejo o ponto de ônibus cheio de pessoas
pessoas que andam
correm
refugam a si mesmas...
Arroto, saio de cena.
Cambaleio e vomito e penso: Poxa... Quando vai acabar?
Sento no chão
fecho os olhos
esperança inútil de a náusea passar
esperança inútil é o que mais se vende...
É o que mais se compra...
A minha esta com os ratos...
Com os ratos...
Sinto o calor da manhã
a fumaça dos carros velhos e barulhentos que vão e vem na rua.
Me levanto.
Outra vez apoiado na parede...
É a única coisa que me apoiaria nessas horas...
Dou dois passos, olho pra frente...
Respiro fundo e...
Continuo.



Felipe Ribeiro