quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Procura-se

Depois de desabar na cama
E sentir todo o calafrio do silencio
Todo o som da solidão
E toda decrepitude
Do calor
Do fedor
Das emoções baratas
Futéis e evazivas
De um dia inteiro de tentativa
E, só para constar, de falhas
Eis que surge naquele sujeito
Aquela sensação ambígua
De desespero e paz.
A gata surge e ronrona entre suas pernas
Sobe e deita sobre suas costas suadas e frias
Sai de cima e deita ao seu lado
Mia pedindo água
E o sujeito
Movido agora pela paz
Enche a tigela com água
E, mais uma vez, desaba por sobre a cama
E, espera
Espera como se aquilo fosse seu ar
Espera como se aquilo fosse ser a sua salvação
E, espera
Anciosamente
Num misto agora de tédio e angustia
Que, no fim das contas, sabe ele bem que o que perdurará será o tédio
Eis que o sujeito olha para a porta
E ela fica parada
Eis que o sujeito olha para o telefone
E ele não toca
Eis que o sujeito olha para si mesmo
E ele não mais se olha
Só renova
A espera insana
De acontecer alguma coisa
De belo
De útil
De mágico
De absurdo
Então ele tenta criar o mundo
Em seus pensamentos
E, para sua surpresa
O mundo ideal se contaminou
Com o absurdo do mundo real
E para a sua surpresa
Ele não se surpreende
Com o fato de que ele
Não mais consegue
Sonhar.




Felipe Ribeiro

terça-feira, 21 de outubro de 2008

Fome de vida.

Diante do calor escaldante da tarde de uma segunda-feira...
Diante do tédio que me enchia suportavelmente...
Diante de tudo que não há graça alguma no mundo...
Diante do artificial...
Do banal...
Do insulto...
Encontrava-me sozinho...
Absurdamente só...
No mais absurdo dos lugares...
Um ponto de onibus.
Estava sentado, olhando tudo sem ver nada...
Quando derrepente fui laçado por um cheiro...
Um cheiro suave... doce
Um cheiro que, se pudesse caminhar, seria lento...
Silencioso, sutil...
E cheio de vida e fogo...
Segui meu nariz e vi...
Esfreguei os olhos e revi...
Jurava que até aquele momento não acreditava em fadas...
Ou alguma criatura mágica do genero.
Mas... Sim, porque não? Havia magia...
E só o cheiro poderia contar por si que aquilo estava no lugar errado
Não poderia ser desse mundo... Ou daquele lugar.
Uma moça... Cabelos negros, ao estilo channel...
Cabelos lisos, finos... brilhantes de um negrume espelhado...
Um nariz fino e um pouco grande contrastava lindamente com seus imensos olhos negros cheios de lápis preto que terminava com um desenho fino no canto dos olhos...
Usava um vestido vermelho... Só disso que me lembro, realmente não prestei maior atenção a suas roupas ou indumentarias...
Se sentou ao meu lado...
Com certeza minha cara estava abobada...
Com certeza minhas pupilas estavam diltadas...
Com certeza minha boca estava entre-aberta...
Mas.. que se dane...
O mais interessante é que ela me olhou...
Me olhou! Não poderia acreditar...
Nessas horas voce se sente atingido por uma noção bastante verdadeira de existencia própria...
E ao mesmo tempo voce quer existir...
Onde, quando? Pouco importa... voce só quer existir... para aquilo tudo...
Sorriu...
Pra quem?
Pra mim? Não pude acreditar...
Se levantou e fez um sinal com a mão...
Subiu no onibus devagar...
Era ela uma serpente? Ou uma gata? Realmente não se ouvia seus passos...
Rebolava de leve... Seus quadris hipnotizavam...
E suas coxas ficaram expostas por um milesimo de segundo...
Mas fora o suficente para me lembrar para sempre...
Daquele calor
Daquele calor...


Felipe Ribeiro

domingo, 12 de outubro de 2008

Estenda as mãos...

Eis que me deparo com a sala de aula vazia e escura.
Ora, até ai nenhuma surpresa, cheguei trinta minutos mais cedo, completamente embriagado por uma mistura de desespero, sufocamento, desinteresse, depressão e, via de regra, alcool. Como disse, até ai nenhuma surpresa, sempre me sinto assim, ou pelo menos nos ultimos 5 anos. Escorei minha cabeça na carteira e fiquei esperando o horário da aula, sentado nos fundos da sala daquela faculdade pública.
A porta da sala se abre e surge uma figura feminina na escuridão. Ascende a luz e me olha.. nos olhamos. Ela ascena com a cabeça e eu com os olhos. Ela se senta nos fundos da sala ha algumas carteiras de distancia de mim. Nem dou moral, ela é uma amiga tranquila que conversa na hora que bem lhe entende e não tem frescuras; eu também não queria papo, por isso a cena toda é um grande túmulo: eu de um lado, escorando minha cabeça na carteira; ela de outro examinando suas unhas por fazer.
Derrepente ela se levanta e chega até a mim. Se agacha ao meu lado e diz:
- Força Felipe... A linha é tênue, voce tem que ter força...
Não sei ao certo, mas tudo o que ela me disse naquela hora fez todo o sentido. Ela ainda continuou:
- Eu já vi a cara do monstro, a linha é tênue, tenha força... O monstro esta sorrindo sempre Felipe, não de essa chance a ele!
Novamente fez todo o sentido... Agradeci com os olhos a minha amiga, me levantei e matei a aula. Fui até um bar e bebi até cair. Passei a noite na rua e, de uma maneira estranha, senti toda a paz do mundo, ou pelo menos toda a paz que um homem no auge dos seus 22 anos poderia suportar.
De onde vinha aquela força? De onde? É, ela tem toda a razão... a linha é realmente tênue...



Felipe Ribeiro

sábado, 11 de outubro de 2008

Mãos atadas

Mais uma noite sem sentido...
Ha dias que parecem não existir...
E, no entanto, contam como um dia...
Mais um pra conta do mais próximo do ultimo dia em que voce vai viver...
É interessante notar esses dias vazios...
Simplesmente nada acontece, e voce sabe disso...
Simplesmente nada vai acontecer, e voce também o sabe.
Tediosos dias.. em que justamente voce não quer fazer nada...
E, no entanto, ao mesmo tempo, gostaria de fazer de tudo...
De tudo...
Mas.. só gostaria... O que o leva a não fazer?
Preguiça, desmotivação?
Não... Diria que esses dias vazios são sábios!
Sim, sábios! Eles nos gritam na cara o tempo todo:
"Não durma, pois a vida é isso! Não, não ouse sonhar!"
E, no entanto alguns sonham...
E juram que podem ser felizes...
E juram que tem escolhas...
E juram que escolhem...
E juram que juram algo pra si mesmos...
Juram que domam as rédeas do cachorro louco do destino...
Mas mal sabem que esse cachorro esta morto...
E o louco é quem esta tentando domar o destino inexoravel...
Ahh o que me sobra é o tédio...
E é esse tédio que sobra na maioria das pessoas...
E é contra ele que elas se degladiam...
Se esforçam para mostrar para si e para o mundo que algo há de se compensar...
E realmente há sim...
Diria que o fato de tentar se rebelar...
Se mecher, se virar...
Ahh, como eu as invejo!
Ahh, como eu sei que essa mesma inveja, ao mesmo tempo...
Não faz o menor sentido!


Felipe Ribeiro

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Reminiscencias...

Acontece sempre quando menos esperamos...
E, talvez por isso, sempre acontece e nunca percebemos.
È uma coisa estranha, sem nome.
Sem sabor também.. Sem cor, sem cheiro...
É o unico acontecimento que voce tem plena consciencia de que aconteceu
E é o unico que, ao mesmo tempo, voce não faz idéia do que é.
Talvez uma musica que te faça lembrar de um cheiro...
Ou um cheiro que te faça lembrar de uma musica...
Não se sabe quando, nem onde, nem o porque...
Mas é como um soco.. um soco forte.
Um soco no estomago... te deixa sem ar...
Sem palavras.
E de repente o tempo parece parar e retroceder...
E quando isso acontece tudo do agora se evapora...
E voce volta a ter 18 anos...
Volta a ter a oportunidade de ouro...
De dizer pra si mesmo: "Não faça isso!".
O problema é que voce não escuta a voce mesmo...
E, num passe de mágica toda a sua vida se torna um jogo...
De ações e reações, azares, sortes...
Imprudencias e, quem sabe, sabedoria.
E voce percebe bem que aquele soco foi voce mesmo quem o deu...
E voce percebe bem que a vida é um paradoxo sutil...
Percebe bem que ela é extremamente frágil...
Mas o é justamente porque faz laços fortes...
Tão fortes que deixam marcas...
E essas mesmas marcas se mostram...
Ao menor tom de uma canção...
Ao mais insignificante cheiro...
Ao infimo espaço de alguns segundos.
E ficam... ah, se ficam...
Para sempre,
Enquanto durar.



Felipe Ribeiro.

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Invocações.

A batida leve na porta me fez saltar da cama.
Ascendi o abajour meio perdido.
O que, ou quem poderia ser... vai saber!
Só sei que olhei os numeros vermelhos do relogio digital...
E nele cravavam virtualmente quatro numeros...
03:54.
Esperei outra batida na porta...
E novamente uma, duas, tres batidas leves...
Como uma seda tocando na madeira...
Me levantei, abri de súbito a porta.
E...
Nada.
Nem ninguém...
Só o corredor porcamente iluminado pela luz do abajour.
E, porque não, o frio.
E, porque não, aquela solidão.
E, porque não, a saudade.
Aquela saudade que tem gosto e cheiro...
De quando aquela porta se abria para entrar uma mulher.
E se fechava para entrar o amor.
Sentei-me na cama, comovido por uma espécie de auto-comiseração.
Apaguei o abajour e deitei, sonhando acordado com o desespero do fato...
Daquele fato aterrador...
De estar ficando maluco em ouvir batidas na porta.
Eis que novamente surge-as...
Uma, duas, tres batidas leves...
Não custava tentar... Disse: Pode entrar.
Então a porta se abriu
E o vento gélido me beijou.
E eu poderia jurar que ouvi um boa noite...
Meu amor.


Felipe Ribeiro