sábado, 28 de fevereiro de 2009

Passos na noite.

Queime meus sonhos
Com seus lábios impuros
E as palavras mais frias
Que como a um susurro
Destroem a minha vida
E corroem o meu mundo...
O meu mundo...

Fria e escura
São as noites vazias
Das lembraças ingenuas
Do calor do futuro
Dos meus absurdos
louváveis absurdos

Esperança não tenho mais
O que me sobra a essa hora
Das vaidades mortas
É o nunca mais
É o nunca mais

Pego a estrada noturna
Ando olhando pra lua
Esquecendo a cada passo
Meu cansaço...
Meu cansaço...

Felipe Ribeiro

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

Pelas noites.

Lá estava ela...
Fria, parada, me esperando...
Ou quem sabe qualquer outro
Que fosse ao seu encontro...
Mas só estavámos nós...
Sós, um aguardando o outro...
Bastava me aproximar e botar a coisa toda pra funcionar...
Bastava eu agir...
Bastava eu...
Bastava...
Basta!
Não poderia mais aguentar esse estado de coisas.
Aproximei-me munido de coragem,
De vontade,
De esquecimento.
Peguei-a, estava fria...
Pus ela para funcionar...
Não funcionou como eu queria.
Mas me obrigou a olhar para algumas coisas.
Coisas fora de foco, fora das vistas...
Fora de qualquer intenção que eu poderia sugerir.
Ela funcionou, para mim...
Mas ao contrário.
Quanto a ela...
Retornou ao seu esconderijo...
Fria, como sempre fora.


Felipe Ribeiro

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Conversas pra boi dormir, parte 2.

Ahhh... quarta feira, seis e meia da tarde... Onibus mais do que lotado. Enfim, não se podia fazer muita coisa a não ser se equilibrar pra não enfiar a cara no suvaco da gorda alta e loira e de meia idade à sua frente... Fora isso aquela sensação de estar sendo espoliado, de terem enfiado uma faca no meio dos seus bagos e arrancado toda e qualquer manifestação de descencia própria que estaria em algum canto da consciencia. Eis que sai a gorda alta e loira e de meia idade e dá-se lugar a dois adolescentes, ambos usavam bonés coloridos, um litro de gel no cabelo e muitas espinhas na cara, e claro, só pra constar, conversavam muito, muito, muito alto... Aquela sensação de nausea, aquele pensamento cortante e constante: Deus, onde estava a minha coragem de ir a pé? Não pude deixar de ouvir a maldita conversa... Na verdade nem podia deixar de ouvir, não porque era uma conversa interessante mas sim porque simplesmente eu estava entre os dois... Cristo, onde é que a gente consegue forças para não perder a cabeça? Enfim... Lá vai a conversa. (sim, parece contraditório eu ter decorado toda a conversa, mas, como voces verão, ela é muito simples e por deveras repetitiva...)
-Cara! Puta que pareo, PUTA QUE PAREO!
-Fala maluco!
-Cara.. tipo assim, puta merda meo!
-Só... Também acho! Depois do que o professor falou pra Jaqueline... Meo, eu teria estourado a cara dele!
-Não cara, tipo... Foi foda!
-É... Cara... a Luana é uma gata heim?
-Pode crer... Só de ter beijado ela eu notei que ela é de boa...
-Qualé cara? Voce ficou com a Luana?
-Ihhhh, tá por fora... Pego memo!
-Ahhh cara, vai tomar no cu!
-Sério cara, to te falando...
-Nó... que paia heim? E o Diego, ficou sabendo?
-Que isso cara, lógico que não, deerrrrr!Ce acha que eu vou dar bobera assim? E outra cara, a Luana é de boa demais...
(nota mental, de minha parte, essa Luana era uma puta... voltando com a conversa.)
-Só...
-Cara, essa bosta de aparelho é uma merda! (nota mental, de minha parte outra vez... Redundancia, voltemos com isso.)
-Só...
-Fode com os beijos! De vez em quando eu arranco umas lascas do beiço das muié...
-Só...
(nota mental... Socorro!)
-Cara... Que paia... porque voce não pode ir lá em casa?
-Foda cara... Minha mãe grilou véi! (aqui tenho que fazer outro parenteses... em toda a conversa essa foi a frase em que mais se falou em tom baixo...)
-Foda...
-É.. foda demais...
-É...
-É... Falou fi, depois a gente se ve...
-Ou, falou...

Nesse momento uma cadeira se esvaziou na minha frente. O adolescente que ficou no onibus sentou-se nela de uma vez, quase sentando no colo da senhora que estava sentada antes. Eu estava carregando uma sacola plástica de um supermecado... Essa sacola pesava 4 quilos... Cheio de areia pra gato... Não fiz nada. Dei o sinal e desci. Mais pobre, mais sujo e mais infeliz.


Felipe Ribeiro

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Baboseiras de uma tarde de domingo.

Enfim, era um dia como outro qualquer... Levantei cedo, lá pelas três horas da tarde, peguei algumas moedas para ir até o mercado comprar uma aspirina pra minha bruta ressaca de dois dias... Claro, também queria colocar alguma coisa na barriga, o que fez com que a busca por mais moedas durasse mais uma hora e meia. Enfim, sai de casa para ir ao mercado. A rua estava vazia, a não ser por um homem que ia na mesma direção que eu, um homem negro, forte, sem camisa, só de bermudas, chinelos e uma lata de cerveja numa das mãos. Até ai tudo bem, o que me chamou a atenção foi um muleque de seus 12 anos andando numa velocidade absurda em sua bicicleta xingando todo mundo por quem passava fino. Passou por esse homem e o chamou de angolano, veio pra cima de mim com a bicicleta na fina, não sai do lugar, me chamou de viado. Bom, neste sentido alguma coisa me subiu a cabeça, talvez raiva ou algo do genero, mas algum comando me fez dar um chute na roda traseira da bicicleta do garoto. Nem vi o que aconteceu, não virei pra olhar, mas ouvi o barulho do ferro da bicicleta estourando no asfalto... depois um grito, depois um choro e depois mais alguns xingamentos, dessa vez dos tipos "filha da puta, corno, desgraçado". Onde foi que ele aprendeu tal vocabulário, na escola? Enfim, cheguei a conclusão de que não era comigo e continuei meu caminho. Ao voltar pra casa o garoto ainda estava na rua chorando. Pude ver o estrago, bom, foi pouco, merecia mais, mas pra ele tava bom. O garoto chorava e pagava de santo na frente de sua casa. Quando me viu chegando apontou pra mim e chamou pelo pai. Pensei, poxa, até que enfim um pouco de diversão. Engoli essas palavras ao ver o tamanho do sujeito. O cara era enorme! Respirei fundo, alguém tinha que fazer alguma coisa! Fiz o que estava a meu alcance, me virei e corri, corri o máximo que pude. O pai do pequeno filho da putinha estava de moto, logo me alcançou. Pulei um muro na tentativa de escapar dele, mas não deu muito certo, ele me puxou pelas calças e me arrastou pra baixo. Depois disso não me lembro bem quantos socos levei, ou o quanto a minha honrada mãe foi injustiçada, só sei que a dor de cabeça que tinha por conta da ressaca havia sumido, dando lugar a uma dor aguda no nariz que me fazia lacrimejar toda vez que tentava respirar. Voltei pra casa com apenas um olho aberto, passei pelo garoto da bicicleta, ele sorria e apontava o dedo pra mim. Pensei, o que é um peido pra quem já esta cagado? Dei-lhe um cascudo e um pontapé na bunda. Nem precisa falar que sai correndo pra casa antes mesmo de o garoto reclamar com o pai outra vez. Cheguei em casa, tomei a aspirina, comi os dois pães que pude comprar; fui ao banheiro e limpei minha cara, ou o que havia sobrado dela. Neste dia cheguei a conclusão de que nem sempre os mais fortes ou os mais justos vencem nesse mundo. Um mundo meio injusto, não acham?


Felipe Ribeiro

sábado, 7 de fevereiro de 2009

Sobre a verdade. (parte 2)

O homem, simplório como era, não pôde entender de imediato o que o velho quis dizer... Saiu da caverna tomando mais cuidado para com os degraus, não só porque temesse cair, mas antes porque sabia o que era a dor de cair de uma escadaria. Com o auxilio da prudencia ele enfim reparou que a cada passo que dava sentia o vento em sua cara, ouvia o seu som, seu frio, seu sabor...
Desceu a montanha se sentindo renovado de alguma maneira, olhou para os lados e viu a pobreza do vilarejo... Mulheres idosas carregando fardos de gravetos imensos que as obrigava a quase andar de gato, crianças barrigudas que ha muito perderam a graça de brincar e que agora estavam a ajudar suas familias com o trabalho na lavoura... Como ele não pôde enchergar todos esses abusos do mundo? Foi o que ele se perguntou... Então, de súbito, ele reparou em outro absurdo: O seu antigo problema era mais simples do que ele pensava... Sentiu vergonha, quis andar sem ver todos os horrores ao seu redor... Quis fugir, e assim o fez. Chegando a uma cidade mais próxima dali entrou em um bar, pediu uma cerveja. Um rapaz de seus doze anos o atendeu. Era sujo e seus olhos não brilhavam nada, nem tristeza, nem agonia, nem mesmo indignação. Não continuou com a cerveja. Sentiu que uma mão havia pousado em seu ombro. Ele se virou e viu uma moça, simples, vestida minimamente e com um olhar escandalosamente triste. Era uma antiga freguesa. Ela deu-lhe a oferta habitual. Ele começou a chorar. Como não poderia não reparar nos olhos dela anteriormente, das outras vezes? Se sentiu imundo. Saiu do bar, já era noite alta. Entrou em um hotel barato. Não conseguiu dormir. Um pensamento latejava: "Como pude ser tão egoista?". A verdade não lhe deu paz, ao contrário de como haveria de imaginar. Decidiu ir no Guru outra vez, aquilo ficara mais insuportável quanto antes. Ele queria a paz, e não o caos!
Chegando ao altar viu-se a mesma cena. O velho estava sentado na pedra. Olhava serenamente para o homem. O homem então lhe disse:
- Essa verdade é insuportável! Não é essa verdade que eu gostaria de ver!
O velho suspirou, sorriu, e então lhe disse:
- A verdade é que fazer o chá de boldo dá muito mais trabalho do que tomá-lo. Mas, quando se toma, todo o sacrificio se torna aceitavel. Voce quer tomar o chá, mas para tanto voce quer que alguém o faça para voce... Como pode isso? E quando ninguém mais cooperar para com as suas dores, como vai ser? Preferirá não tomar o chá e se acostumar com as suas dores, ou irá faze-lo?
- Não sei fazer esse chá...
- Ora, é tão simples! Colha as folhas, encha uma panela com água e esquente... Fazer o fogo é mais dificil, esse é o trabalho... Para que o chá fique bom, a água tem de ser fervida, e fazer o fogo não é facil...
O homem então entendeu alguma coisa disso tudo. Ficou com medo, ou uma súbita preguiça. Mas lembrou-se das dores, da aflição e do desespero. Resolveu pintar o quadro a sua frente com fortes pinceladas, dar-lhe cor, tom, forma. Como? Cada um saberia a melhor maneira de o faze-lo.


Felipe Ribeiro

Sobre a verdade.

Havia um homem completamente perdido em vida, completamente amedrontado pelo simples fato de respirar e que não conseguia achar a clareza da verdade do mundo no mundo e em si mesmo. Procurou diversas fontes de prazer, mas tudo o tornava mais ansioso, vazio e rabugento. Parecia-lhe que tudo que costumavam dizer que era bom nesse mundo não fazia-lhe o menor efeito. Estava descontente com o mundo e consigo, desgostoso para com os sabores da existencia, cego para com as cores ao seu redor. Então este coitado descobriu que no alto de uma montanha havia um monge, um eremita que era chamado por todos ali de Guru, o clarividente, o grande mestre que poderia lhe auxiliar para o caminho da verdade e da luz.
Foi em busca desse homem com a promessa de salvação. Subiu os milhares de degraus até chegar ao templo simples escondido dentro de uma caverna. Lá dentro pôde observar que havia um velho sentado em cima de uma pedra plana, usando trapos velhos e sujos, tão sujos quanto sua barba amarelada e oleosa. O homem então se aproximou e disse:
- Ó grande mestre, vim de longe para saber da verdade do mundo, em busca de paz e equilibrio! Me diga, por favor, qual é a verdade do mundo?
O velho então o olhou com olhos serenos e, sorrindo, disse:
- A verdade é que chá de boldo é uma delicia!
O homem ficou muito nervoso, xingou e blasfemou contra o velho, prometeu se vingar da infamia e saindo da caverna pisou em falso e escorregou pelos degraus. Caiu por volta de uns trinta metros e desmaiou. Acordou num lugar umido e frio, amparado por uma coberta fina estava deitado sobre palha, ao som de estalos da fogueira que estava por ali a lhe esquentar.
Levantou um pouco a cabeça, sentiu que estava todo dolorido, e com muita dificuldade chamou por alguém. Logo se escutou uma batida de bengala no chão que se aproximava. Era o tal guru trazendo consigo uma caneca de madeira com algo quente que esfumaçava por entre suas barbas amareladas.
-Tome. - O velho lhe disse servindo a caneca ao homem.
Este, por sua vez assoprou e tomou. Era gostoso e logo fez se sentir melhor.
- O que é isso? - Perguntou o homem.
- Isso? É a verdade que tanto procuras. - Indagou o velho.


Felipe Ribeiro

domingo, 1 de fevereiro de 2009

Poema ao covarde

Como se fosse um caminhão...
O rapaz sentiu que algo lhe trombava...
Empurando-o para a completa escuridão,
Das coisas mortas que lhe assombrava...

Prostrado ficou na cama
A esperar a calmaria
Suas dúvidas o queimavam como chama
E, cansado, por nada mais esperaria...

Começava a ficar insuportavel
Aquela sensação de sufocamento
Levantou-se, ligou o rádio...
Uma música para seu alento...

Na estação ouviu-se
Três e quinze da madrugada
Em seu coração sentiu-se
Como a uma presa em disparada

Ofegando, suando, se desmembrando
A razão ia se despedindo...
Logo o grito veio em pranto...
Era a vida lhe impedindo...

Impedia-lhe o controlar,
A sua vontade e o que tinha de ser feito...
Ele se sentiu a levitar...
Por entre o certo e o medo...

Fechou os olhos em lágrimas...
Desejou ser indiferente...
Assim como todos os párias...
Que compunham aquela gente.

Desejou enfim, desejar...
O banal
E ousou querer amar...
O que não o tornava como tal.

A responsabilidade tem seu preço,
E ele não estava preparado
Sentiu enfim desaparecer o peso
Pelo simples fugir ao Ato.

Afinal, é o que todos fazemos
Ele comodamente concluiu...
E o mundo continuou querendo
Quem por certo não admitiu...



Felipe Ribeiro