Há pessoas que confundem a mudança de opinião com uma possível contradição. A questão é mais complexa, porque essa confusão se dá justamente porque se confunde fidelidade com imobilidade de idéias, o que, a meu ver, nada mais é que um passo para o fanatismo. Acredito que mudar de opinião não seja uma contradição, seria, antes, uma prova cabal do que se decidiu de fato ser ou seguir ou fazer. Toda decisão é uma renúncia, pois se você decide você renuncia alguma escolha em prol de outra ou em detrimento de outra. Contradição não seria não saber o que se quer ou o que se pretende ser, isso é simplesmente ignorância de si mesmo. Contradição é, antes, uma espécie de traição, é você se trair sabendo que se trai, é você mentir para si e para os outros, sabendo que mente, mesmo que seja em prol dos outros ou em detrimento dos outros. E o que mais posso observar é uma onda de contradição, para não dizer mentira, invadindo o cotidiano silenciosamente, sutilmente, imperceptivelmente... É o amigo que lhe diz ser especialista em mulher quando, todos nós sabemos, nem mesmo as mulheres são especialistas nelas mesmas; é o sujeito que se mata no trabalho, que só lhe traz humilhação para a alma, mas que mesmo assim é fiel à imagem de bom cidadão que tenta e busca passar... A contradição está solta e com ela há apenas e tão somente desespero na medida em que não se pode mais controlar o próprio querer, a própria vontade. Em resumo, a mentira leva a mais mentira e, consequentemente a mais e mais prisão da própria vontade, o que os mentirosos não conseguem ver simplesmente porque confundem o ato de mentir com o ato de ser esperto que o engano consequente dessa mentira pode causar. Ser esperto, aliás, é outro predicado caro nos dias de hoje. Um predicado, ao que tudo indica, neutro, amoral, sem cor, apenas refletindo a vontade cada vez mais dependente de mentiras da pessoa que utiliza essa qualidade. Um ato de liberdade seria portando a verdade, tão somente a verdade. E se dizem que a verdade dói é porque não estamos acostumados com ela. A verdade dói mas a mentira destrói. Outra confusão que a maioria das pessoas tendem a fazer... Nem tudo que dói é destrutivo, mas tudo que é destrutivo sempre dói, e muito mais no fim das contas. Outra confusão é entre prazer, gozo e paz. Ter paz não significa propriamente ter prazer, a paz é alcançada, na maioria das vezes senão em todas, pela busca individual da verdade de cada um. E essa busca pode significar dor, renúncias dolorosas. Mas, a verdade é a única coisa que liberta cada um e se liberta é possível suportar e se suporta tudo fica mais fácil, mais fraco, mais viável. A questão é que nos inviabilizamos a nós mesmos a todo instante com as mentiras, e isso tem por consequência o estranhamento gradativo de nós por nós mesmos. Daí as confusões, os medos, os receios, os encantos desencantados, os desencantos encantados. Não se deve, claro, resumir o homem e seus problemas só e tão somente só nisso. O ser humano é por demais rico, por demais complexo e por demais confuso e contraditório para se dizer alguma coisa com toda a certeza, com toda a calma. Mas esboço aqui apenas um esboço. E esse esboço esboça apenas outro esboço daquilo que presumivelmente pode ser. E se é, não sei, mas aceito que pode ser sim. E entre saber e aceitar há de fato uma distância imensa...
Felipe Ribeiro
quinta-feira, 4 de novembro de 2010
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