sábado, 7 de fevereiro de 2009

Sobre a verdade. (parte 2)

O homem, simplório como era, não pôde entender de imediato o que o velho quis dizer... Saiu da caverna tomando mais cuidado para com os degraus, não só porque temesse cair, mas antes porque sabia o que era a dor de cair de uma escadaria. Com o auxilio da prudencia ele enfim reparou que a cada passo que dava sentia o vento em sua cara, ouvia o seu som, seu frio, seu sabor...
Desceu a montanha se sentindo renovado de alguma maneira, olhou para os lados e viu a pobreza do vilarejo... Mulheres idosas carregando fardos de gravetos imensos que as obrigava a quase andar de gato, crianças barrigudas que ha muito perderam a graça de brincar e que agora estavam a ajudar suas familias com o trabalho na lavoura... Como ele não pôde enchergar todos esses abusos do mundo? Foi o que ele se perguntou... Então, de súbito, ele reparou em outro absurdo: O seu antigo problema era mais simples do que ele pensava... Sentiu vergonha, quis andar sem ver todos os horrores ao seu redor... Quis fugir, e assim o fez. Chegando a uma cidade mais próxima dali entrou em um bar, pediu uma cerveja. Um rapaz de seus doze anos o atendeu. Era sujo e seus olhos não brilhavam nada, nem tristeza, nem agonia, nem mesmo indignação. Não continuou com a cerveja. Sentiu que uma mão havia pousado em seu ombro. Ele se virou e viu uma moça, simples, vestida minimamente e com um olhar escandalosamente triste. Era uma antiga freguesa. Ela deu-lhe a oferta habitual. Ele começou a chorar. Como não poderia não reparar nos olhos dela anteriormente, das outras vezes? Se sentiu imundo. Saiu do bar, já era noite alta. Entrou em um hotel barato. Não conseguiu dormir. Um pensamento latejava: "Como pude ser tão egoista?". A verdade não lhe deu paz, ao contrário de como haveria de imaginar. Decidiu ir no Guru outra vez, aquilo ficara mais insuportável quanto antes. Ele queria a paz, e não o caos!
Chegando ao altar viu-se a mesma cena. O velho estava sentado na pedra. Olhava serenamente para o homem. O homem então lhe disse:
- Essa verdade é insuportável! Não é essa verdade que eu gostaria de ver!
O velho suspirou, sorriu, e então lhe disse:
- A verdade é que fazer o chá de boldo dá muito mais trabalho do que tomá-lo. Mas, quando se toma, todo o sacrificio se torna aceitavel. Voce quer tomar o chá, mas para tanto voce quer que alguém o faça para voce... Como pode isso? E quando ninguém mais cooperar para com as suas dores, como vai ser? Preferirá não tomar o chá e se acostumar com as suas dores, ou irá faze-lo?
- Não sei fazer esse chá...
- Ora, é tão simples! Colha as folhas, encha uma panela com água e esquente... Fazer o fogo é mais dificil, esse é o trabalho... Para que o chá fique bom, a água tem de ser fervida, e fazer o fogo não é facil...
O homem então entendeu alguma coisa disso tudo. Ficou com medo, ou uma súbita preguiça. Mas lembrou-se das dores, da aflição e do desespero. Resolveu pintar o quadro a sua frente com fortes pinceladas, dar-lhe cor, tom, forma. Como? Cada um saberia a melhor maneira de o faze-lo.


Felipe Ribeiro

Um comentário:

Fábio disse...

bLOG LEGAL!PARABENS!